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sábado, 12 de setembro de 2009

A Era da Negação

A moda agora é negar. Negar que recebeu, negar que pagou, negar que sabia... Essa onda vem de cima e avalancha (nego que criei esse verbo esdrúxulo) tudo e todos. Negar é mais fácil, a gente se exime de tudo.

Negro nega que é negro. Pobre nega que é pobre. Até rico anda negando que é rico. Vejam só onde chegamos. Uma negação total.

E essa onda negativa acaba de tomar conta inclusive do último foco de resistência que havia: o meio literário. Não todos, mas quase (percebam aqui também a negação). Depois de ouvirem nosso presidente negar a leitura, dizendo que lhe dá azia, e que não consegue ler muitas páginas porque lhe dão sono, muitos novos autores acham que podem tornar-se escritores sem ler. E muitos velhos autores acham que podem negar tudo de novo que se produz. Mas o presidente fez pelo menos uma afirmativa, o que nos salva da negação absoluta. Ele assegurou: “Vejo televisão, quanto mais bobagem, melhor.”

Confesso que eu, que trabalho para a literatura há anos, vejo meus esforços renegados diante desta frase da maior autoridade do país. Ouso afirmar, no meio disso tudo, que essa crise “negatória” não passa de um problema de identidade. Não sabemos quem somos, nem de onde viemos, nem onde estamos.

Digo “nem onde estamos” pois muitos tem vergonha de se dizer brasileiros, gaúchos ou caxienses. A alcunha de “escritor caxiense”, por exemplo, soa como um estigma para alguns, que em suas cabeças desavisadas parecem residir em Paris ou em Nova Iorque. Confundem sua pessoa, que mora em uma cidade localizada geograficamente, com sua obra, que pode ou não ser universal. E pregam a distinção entre autor e obra. Mas a contradição vai sem rédeas quando esses burocratas da literatura negam que haja uma fórmula para a arte e ao mesmo tempo dizem que não há caminhos duplos. Como assim? Se não há uma fórmula é porque existem vários caminhos, duplos, quíntuplos. A negação pode ser muito contraditória. Cuidado!

Sempre desconfiei de pessoas que vivem com o “não” na boca. Negam a terra, negam a liberdade, negam até a arte, criando fórmulas escamoteadas nas entrelinhas de seu discurso proibitivo.

Por tudo isso, assim como fiz no ano passado, convoco a todos os escritores e artistas de nossa cidade para participarem do II Encontro do Escritor Caxiense, que ocorrerá durante a Feira do Livro, em outubro. É hora de assumirmos nossa identidade, planejarmos nossas ações e, de uma vez por todas, dizer SIM às nossas origens e à nossa literatura.

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