Páginas

terça-feira, 9 de março de 2021

Cárcere literário, com prazer

O texto é antigo, mas ainda me enche de alegria e orgulho.

Ótima análise da escritora Márcia Falkenbach, sobre meu
CELA DE PAPEL.
O livro também é antigo, de 2006, mas muito atual. Boa leitura.
Cárcere literário, com prazer
Márcia Falkenbach
“Cela de Papel” transcende. É muito mais do que apenas um livro, uma mera obra literária; é um pedaço de imaginação em estado puro, escrito com a maestria dos gênios. Em nada perde para os grandes e imortais clássicos. Não é um livro a ser lido, é uma obra a ser sentida.
Esqueça os olhos, a parte do seu corpo que lê as páginas de “Cela de Papel” é a alma.
Já aviso, não é um livro para leitores amadores, é para aqueles cujo prazer da leitura corre nas veias, aqueles cujas palavras são petiscos para o prato principal: a inspiração plena. “Cela de Papel” não conta uma história definível por uma sinopse. É um apanhado de delírios unidos pelo talento do autor, Uili Bergamin. Já na introdução ele avisa o leitor que nada do que virá é convencional, clichê ou formulaico.
“Só peço perdão aos melindrosos pelo que aí segue. É que literatura não é apenas jogo de palavras. Literatura é emoção, é uma mistura de ingredientes. É vida recolhida em estado prenhe de dor, de amor e de saudade. A história em si (ou o gênero, ou a capa do livro) é apenas a porta de entrada para algo maior. Literatura é feita de palavras boas de se comer.”
Ainda antes de conhecermos um tanto mais do narrador – aquele de que nos tornamos íntimos e descobrimos depois que de fato nada sabíamos – o primeiro parágrafo da obra me fez parar e reler, repetidamente, por se tratar da definição perfeita do sentimento de qualquer contador de histórias.
“O difícil não é a gente ter boas ideias. Nem falar delas. Difícil mesmo é encontrar alguém, especial, que as ouça. No entanto, pior do que não ter a quem contar o que a gente sente, é contar o que a gente sente a quem não sente o que a gente conta. É dolorido. É o diabo.”
Sou leitora voraz, e quase nunca, nas centenas de livros que já devorei, me deparei com um parágrafo tão expressivo, tão ideal. Poucas vezes me senti tão compreendida, tão definida quanto a certeza da dor de quando nossas palavras se perdem no vácuo da ausên
cia daqueles que não sentirão conosco. Mas a beleza da obra não para por aí. Embora com uma história totalmente não convencional, sem linearidade, noção de tempo ou definição exata de personagens (ao longo da obra vamos entendendo quem é quem, mas não há a princípio uma explicação que leve o leitor a acompanhar facilmente os relatos), por diversas vezes tive vontade de saber o que viria a seguir. Toque de mestre. Palmas ao autor. A maestria prossegue, até a grande surpresa, até o espetacular encerramento de uma das obras mais peculiares que já tive em minhas mãos. E em minha mente.
A obra é curta, possível de ser lida em um fôlego só. Não o fiz; preferi degustar, como o próprio autor sugere ao transformar os capítulos em passo a passo para fazer um bolo. Degustei com imenso prazer e terminei lambendo os dedos. Quero mais.
Uma coisa posso dizer com total certeza e sem medo de cair em exagero: “Cela de Papel” mudou tudo. Trouxe-me uma enxurrada de inspiração e uma insaciável vontade escrever. Não que não a tivesse antes, mas agora me sinto livre no universo das palavras. Sinto-me menos presa à fórmulas, mesmo que isso soe pouco comercial e me dê poucas chances de um dia me tornar Best Seller. Seja como for, recomendo a obra como livro de cabeceira, para ler de uma vez só e beliscar de tempos em tempos, quando nada mais saciar sua fome de leitura.

Nenhum comentário: